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Através
de um dos meus entrevistados, o Mário Américo Netto, obtive o telefone
do Ivair. Tive uma conversa rápida com ele por telefone, aceitando de
imediato. A matéria foi feita no clube União Operária, próximo da ponte
da Vila Maria. O Príncipe mostrou muito conhecimento sobre a sua
carreira e deu esta entrevista de forma muito franca. Confiram a
matéria.
FUTEBOL DE TODOS OS TEMPOS: Como surgiu o apelido de Príncipe?
IVAIR:
Este apelido começou em um jogo do Santos contra a Portuguesa. Naquele
tempo não trocávamos as camisas após as partidas. Como eu fiz os três
gols na vitória por 3 a 2, o Pelé na saída me deu a camisa e disse que
“se eu respeitasse o futebol e as pessoas, seria o Príncipe”. No momento
estavam presentes os cronistas Orlando Duarte e Eli Coimbra. E foi aí
que o apelido pegou.
Neste dia Pelé deu a Ivair o apelido de "Principe" devido a sua belissima exibição.
FTT: Houve
muitas cobranças em cima de você? Foram positivas ou achou que a
pressão era muito grande em cima de um apelido tão forte como o do Rei
Pelé?
IVAIR: O apelido foi bom, repercutiu muito bem na minha carreira. Até hoje muitos me chamam de Príncipe, Ivair ou sabiá.
FTT: Como começou a sua carreira? Parece que foi nos Infantis da Portuguesa em 1957.
IVAIR:
Vim de Bauru com dois anos pra São Paulo. Fui indicado por um diretor
da Portuguesa, sendo que naquela época nem havia a categoria de
Infantil, pois minha idade não chegava (tinha 12 anos de idade), então
comecei a treinar lá. Ele tinha um filho que se chamava Edmundo, que
jogava na ponta-esquerda da Portuguesa, então me levaram pra Lusa para
treinar. Passei a conviver com o Félix, Djalma Santos e Brandãozinho.
Fui crescendo lá dentro.
FTT: Você teve alguma referência no seu início de carreira?
IVAIR:
Eu gostava muito do Servílio. Depois comecei a disputar jogos
profissionais e passei a gostar do Pelé e do Zizinho. Comecei a copiar
algo deles. Mais tarde passei a conviver com o Pelé, então foi mais
fácil tirar algo dele. Meu pai sempre falava que copiar as coisas boas
não é “falta de atitude”, mas sim “ter atitude”, porque as coisas boas é
que devem ser guardadas.
FTT: Sua
estréia nos Profissionais da Portuguesa foi em 1962, em uma partida que
vocês empataram em 1 a 1 com a Prudentina na Rua Javari. E tem uma
história que quando você fez o gol, ficou tão emocionado, que até
desmaiou em campo.
IVAIR:
Eu acho que desmaiei por causa da bola que era muito grande, sendo que o
gol foi de cabeça. Como cabeceei e fiquei caído, pensaram que eu estava
emocionado. O único que descobriu que eu estava desmaiado foi o
Servílio. Não foi por emoção, mas sim pela bola... risos!
Portuguesa 1965 - A partir da esq. Augusto,Vilela, Félix, Ditão, Amaro, Edilson.
FTT:
O que você tem a dizer desta sua passagem pela Portuguesa? Afinal de
contas você jogou na Lusa de 1962 a 1969, praticamente toda a década de
60.
IVAIR:
Eu só acho que a Portuguesa tem que tomar mais cuidado com os seus
ex-jogadores, porque nem todos gostam da Lusa. Ela tem um defeito muito
grande da diretoria, da qual eles não respeitam aqueles que fizeram o
estádio, porque a Portuguesa existe hoje por causa dos ex-atletas. A
única coisa que eu queria é que prestassem mais atenção.
FTT: Na
época que você jogava na Portuguesa nem tinha o estádio Oswaldo
Teixeira Duarte, o Canindé. Onde eram os jogos da Lusa? Havia algum
campo que vocês mandavam?
IVAIR:
A Portuguesa mandava os seus jogos no Pacaembu, na Rua Javari ou no
campo do Nacional. Quando comecei, a Lusa tinha algo muito bom que o
Santos têm hoje, que era a renovação. Por isso que atualmente o Santos
está em alta, porque no meu tempo quando subi para o time de cima,
vieram mais sete, que foram o Paulinho, Aírton, o goleiro Aguinaldo (que
depois jogar no Santos), Zé Maria, Marinho Peres, Ulisses e Rodrigues.
Vieram muitos jogadores, sendo que o Santos atualmente os copia muito
bem.
Ivai foi capa de diversas revistas esportivas nos anos 60 . Aqui na Gazeta Esportiva.
FTT: A Portuguesa era conhecida como um clube que revelava muitos jogadores.
IVAIR:
A base era boa, coisa que não acontece hoje. Você atualmente olha o
time da Portuguesa e vê um e nada. O Santos tem muito mais torcedores
por causa das categorias de baixo. Os garotos sabem que é muito mais
fácil jogar em cima, porque é o top do futebol. A Portuguesa deveria
levar a sério as categorias de base.
FTT: Nesta sua época havia um goleiro que você era o carrasco dele, que o Valdir Joaquim de Moraes do Palmeiras.
IVAIR:
O Valdir de Moraes era muito amigo meu. Quando eu jogava contra o
Palmeiras, sabia faria uns dois gols. Se tivermos muita sorte contra um
clube, sabemos o que vai acontecer. Tinha muita sorte contra o Valdir. E
foi um grande goleiro
FTT: Na
década de 60 havia zagueiros muito bons, como o Djalma Dias, Mauro,
Calvet, Valdemar Carabina e Roberto Dias. Houve algum zagueiro que te
deu mais trabalho?
IVAIR:
Eu tinha um problema sério com o Djalma Dias e com o Roberto Dias. O
ruim para o atacante é quando o zagueiro joga na direção daquilo que
você quer, que é a bola. Bom para o atacante é quando o zagueiro joga no
seu corpo e te batendo. Este garoto, o Neymar, como ele gosta quando o
cara vem pra bater. Então estes jogadores que citei jogavam com o
objetivo que eu tinha, que era a visão da bola. Eles eram craques.
Quando a defesa joga querendo mais te bater do que jogar, é melhor para o
atacante.
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Portuguesa 1968 - A partir da esqu. Orlando, Ulisses, Marinho, Guaraci, Zé Maria e Augusto;
agachados vemos Mário Américo, Leivinha, Paes, Ivair (sentado sobre a bola), Lorico e Rodrigues.
O PRINCIPE AGORA É DO CORINTHIANS
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FTT: Houve algum atacante que você se entendeu mais?
IVAIR:
Me entendia bem com o Servílio e o Leivinha. Na Seleção Paulista fui
bem com o Pelé. Quando joguei no Canadá me entendia bem com o Eusébio,
que era o meu compadre.
FTT: Houve
um jogo famoso em 1964 entre a Portuguesa e o Santos. Parece que foi a
final do Campeonato Paulista, com o Santos ganhando da Lusa e sendo
campeão naquele ano.
IVAIR:
Nós fomos pra Vila Belmiro jogar contra o Santos. Eles jogavam pelo
empate e era a final do campeonato. Não é que demos azar, pois o time
jogou muito bem, mas tivemos um problema com o Armando Marques, que nos
prejudicou bastante, fiquei chateado porque ganharia um carro fusca.
Perdemos por 3 a 2, que foi uma das melhores coisas que fiz no futebol.
Ivair ouve conselhos de Pelé |
FTT: Foi o momento mais importante da sua carreira?
IVAIR:
Por incrível que pareça tive muitos bons momentos na Portuguesa, pois
também foram vários contra o Palmeiras. Na minha carreira tive muitas
felicidades como jogador. Sempre respeitei os meus contratos e naquele
tempo a diretoria da Lusa respeitava os jogadores. Não é que hoje não
respeita, mas na minha época eu era muito feliz na Portuguesa.
FTT: Você
falou de grandes momentos na Portuguesa e grandes partidas. Porque você
fez apenas um jogo pela Seleção Brasileira em 1966, pouco antes da Copa
do Mundo, numa vitória de 1 a 0 contra o País de Gales?
IVAIR:
Eu já tinha sido convocado para a Copa das Nações. Fui convocado em
1963, 64, 65 e 66 (sempre na reserva). Havia disputado o Campeonato
Paulista de 1965 como centroavante e na Seleção eu fui como
ponta-esquerda, pois haviam grandes jogadores como o Tostão e o Servílio
na posição. Fui puxado pra ponta-esquerda, disputando a posição com o
Edu, Rinaldo e Paraná, autênticos pontas-esquerdas, diferente de mim.
Acabei não gostando e me entristeci bastante. Quando saí da Seleção
falei que não queria mais ser convocado, pois não iria. Convocaram-me
para uma posição que não estava tão acostumado a jogar. Havia sido
vice-artilheiro do Campeonato Paulista como centroavante. Joguei em
várias posições do ataque, como meia-direita e esquerda. Gostava mesmo
era de jogarPortuguesa 1968 - A partir da esqu. Orlando, Ulisses, Marinho, Guaraci, Zé Maria e Augusto;
agachados vemos Mário Américo, Leivinha, Paes, Ivair (sentado sobre a bola), Lorico e Rodrigues.
O PRINCIPE AGORA É DO CORINTHIANS
FTT: Em 1969 você sai da Portuguesa e vai para o Corinthians. Qual foi o motivo da sua saída?
IVAIR:
O meu presidente era o Gregório Marques. Ele se reuniu comigo, com o
Leivinha e o Zé Maria, falando que tinha que começar a negociar os
jogadores pra construir o estádio. Eu não queria sair da Portuguesa
porque estava bem, além de terem me dado tudo que eu não tinha. Fui
vendido para o Corinthians por 970 mil, sendo o segundo jogador mais
caro do Brasil, pois o primeiro foi o Paulo Borges, que custou 1 milhão,
vendido para o mesmo clube. Só saí da Lusa porque eles precisavam,
sendo que o Leivinha saiu logo em seguida para o Palmeiras, Zé Maria foi
pro Corinthians e mais tarde o Ratinho foi para o São Paulo.
Em pé a partir da esquerda : Pedrinho, Dirceu Alves, Ditão, Luis Carlos Galter,
Diogo e Miranda. Agachados: Ivair, Buião, ? , Tião e Suingue.
FTT: Você
saiu de um clube que tinha pressão e foi pra outro que talvez tivesse
mais pressão ainda, pois desde 1954 não era Campeão Paulista, ficando
dois anos no Corinthians, estreando no Robertão, pouco depois do
falecimento do Lidu e Eduardo. Como foi a chegada no Corinthians, sentiu
a pressão e achava que daria pra quebrar o tabu?
IVAIR:
Saí da Portuguesa para o Corinthians porque o Dino Sani era o
treinador. Eu tinha estado junto com o Dino na Seleção Brasileira.
Quando cheguei lá encontrei com o Rivellino, que também era meu amigo,
de família mesmo. Fui familiarizado para o Corinthians. O meu primeiro
jogo foi contra a Lusa e empatamos em 2 a 2, com dois gols meus. O
Aymoré Moreira, desde os tempos da Portuguesa, gostava de me colocar
como ponta-esquerda, foi contratado pelo Corinthians. Naquela altura não
aceitava mais jogar nesta posição, conversei com ele e fui transferido
para o Fluminense. No início eu aceitava jogar como ponta-esquerda
porque não tinha nome.
Corinthians
1970 - A parti da esq. Fogueira, Ado, Ditão, Dirceu Alves, Luis Carlos
Galter e Miranda. Agachados: Paulo Borges, Ivair, Benê, Rivelino e
Aladim.
1971 IVAIR VAI PARA O FLUMINENSE
FTT: Chega
1971, você sai do Corinthians e é contratado pelo Fluminense, onde faz
uma bela carreira, sendo Campeão Carioca em 71 e 73. O que você tem a
dizer desta passagem?
IVAIR:
Foi bom. Muitos pensam que eu digo isso porque fui campeão, mas foi
mais pelo o que o Fluminense me proporcionou. O Zagallo era meu amigo,
estávamos juntos na Seleção Brasileira. Encontrei o Parreira como
preparador físico, que também era amigo meu. Lá foi bom por causa das
amizades e pelo o que aconteceu na minha carreira.
FTT: Por
sinal em 1971 você era um dos titulares do Fluminense. Teve o gol do
Lula na final contra o Botafogo, que houve muita discussão da parte dos
botafoguenses. Você lembra o clima desta partida?
IVAIR:
O Botafogo jogava pelo empate e tinha um time muito bom, com Jairzinho,
Roberto, Paulo Cesar Caju e Afonsinho. Se o Fluminense empatasse,
perderia o título. Fomos para o jogo. Realmente vencemos por 1 a 0, mas
até nós jogadores achamos que o gol não foi lá essas coisas, porque o
Marco Antônio fez falta no Ubirajara sofreu mesmo uma falta.
Ivair no tricolor |
Fluminense Campeão carioca 1971 - A partir da esq. Oliveira, Félix, Denilson, Galhardo,
Assis e Marco Antonio. Agachados: Cafuringa, Didi, Flavio, Ivair e Lula.
FTT: Teve também 1973, mas você já era reserva neste time.
IVAIR:
Fui mais reserva porque vinha de muitas contusões e foi nesta época que
operei o joelho. Chega uma hora que a contusão te atrapalha. Depois me
firmei, fui para o Paysandu e a carruagem voltou a funcionar bem, tanto
que fui para fora do Brasil.
FTT: Antes
disso, uma curiosidade da minha parte, pois em 1973 você foi campeão
pelo Fluminense e coincidentemente em São Paulo a Portuguesa era campeã,
um título do qual você buscou durante muito tempo. Como você recebeu
este título da Lusa, ficou feliz ou até triste por não tê-lo conseguido?
IVAIR:
Naquele tempo que eu fui campeão pelo Fluminense em 1973, com a
Portuguesa sendo campeã junto com o Santos, gostei muito, porque a Lusa
tinha uma equipe e diretoria muito boas. Hoje ela é um time pequeno e
tem tudo pra ser grande. Tudo que acontece de bom pra ela, eu gosto,
pois fiquei lá durante muito tempo, me trataram bem, como também no
Corinthians, Fluminense e Paysandu, portanto sempre torço pelo melhor
pra eles.
Ivair atualmente segurando a foto dos seus tempos de Fluminense
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FTT: Além destes clubes citados, também teve o América-RJ, que você teve uma rápida passagem.
IVAIR:
Fiz um contrato de três meses no América, porque já tinha um time do
Canadá que havia me procurado. O time deles era muito bom, com o Edu
(irmão do Zico) na meia-esquerda e o Tarciso como ponta-direita. Tive
passagens boas no futebol e não tenho o que reclamar.
FTT: Você falou da sua passagem pelo exterior. Começou no Toronto, do Canadá, jogando com Eusébio e Cruyff.
IVAIR:
Joguei com o Eusébio, Cruyff, Neeskens e muitos outros. Joguei com
vários jogadores importantes. O meu treinador era iugoslavo. Este time
era bom, jogávamos contra o Cosmos de Pelé, Mifflin e Carlos Alberto
Torres. Minha passagem pelo Canadá foi ótima e adorei por eles terem me
dado um pouco de vantagens na América.
Mauricio Sabará e Ivair com um quadro dos seus tempos de Corinthians
FTT: A sua estréia parece que foi, inclusive, contra o Cosmos de Pelé.
IVAIR:
A coincidência minha com o Pelé é muito grande, começando pela cor.
Quando ele foi para os Estados Unidos, o primeiro jogo dele foi contra o
meu time do Canadá, o Toronto Metros, do qual nós ganhamos por 3 a 1. A
minha equipe foi tirar fotografia com ele. O Pelé ainda estava bem,
dava até pra voltar a jogar no Brasil e na Seleção Brasileira.
FTT: Por sinal ele parou de jogar na época certa, no auge.
IVAIR:
Eu acho o Pelé muito inteligente. Alguém o aconselhou pra fazer isso na
hora certa. Quando falou que ia parar, fez o certo na vida dele,
cresceu lá fora porque a América ajuda você a crescer.
FTT: Depois
do Canadá você teve algumas passagens por outros times dos Estados
Unidos e resolveu encerrar a carreira. Como foi este término?
IVAIR:
Sempre fui inteligente, porque copiei o meu pai que não sabia ler e
escrever, mas era o meu filósofo. Quando ele começava a falar, você
pensava que tinha feito uma universidade dos Estados Unidos.
Preocupei-me muito com o meu encerramento de carreira. Não sou como
outros jogadores que encerram e ainda acham que estão jogando. Teve uma
festa no Canadá e achei que tinha encerrado. Como eu tinha aberto uma
escola de futebol no Brasil, da qual eu sou o pioneiro destas
atividades, nesta época o governador Laudo Natel , sendo o Caio Pompeu
de Toledo o seu secretário. Isso foi em 1984. Comecei a trabalhar como
professor. Não senti nada no meu encerramento porque fiz do futebol a
minha profissão e não a minha vaidade, pois se fizesse isso, sentiria
bastante.
FTT:
Finalizando, citarei dois grandes jogadores da Portuguesa de Desportos.
Um, quando atuava, você já não estava mais na Lusa. E o outro, que
jogava na década de 90 e nos deixou em 1994. Bom, você já sabe que estou
falando do Enéas e do Denner.
IVAIR:
Foram, pra mim, dois grandes jogadores. O Enéas, quando subiu, eu já
tinha saído da Portuguesa. Já o Denner foi meu jogador, pois fui campeão
com ele, porque era treinador da Lusa, puxei o Sinval e o Tico para os
Juniores, já vendo a qualidade deles. Quando foram campeões da Taça São
Paulo senti muito a saída deles, pois o Denner foi meu jogador. Já o
Enéas era muito amigo meu. Eles tinham um futuro muito grande. Foi uma
grande satisfação treinar o Denner, pois lembrava o Pelé e poderia
chegar ao nível dele. Infelizmente teve aquela fatalidade, mas, pra mim,
foi um dos maiores jogadores que vi jogar.
Ivair com a foto da seleção paulista da qual fez parte. |
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