Quem
me passou o telefone do Dorval foi o Wilsinho, o meu último
entrevistado até então. A entrevista foi realizada em um campo no bairro
de Congonhas, onde Dorval passa os seus ensinamentos. Foi uma matéria
que tive muita satisfação de realizar, pelo jogador que foi e pelos
craques com que jogou, principalmente o rei Pelé.
FUTEBOL DE TODOS OS TEMPOS: Você
nasceu no Rio Grande do Sul. Na década de 40, um menino que começava a
jogar futebol, tinha o ponta Tesourinha do Internacional como
referência?
DORVAL:
O Tesourinha foi um dos maiores pontas-direitas do futebol brasileiro,
eu o admirava muito, gostava de vê-lo jogar, sendo que depois ele foi
para o Grêmio e foi uma legenda do futebol gaúcho e brasileiro.
FTT: O início de carreira no Força e Luz.
DORVAL:
Comecei nos Juvenis do Grêmio. Depois havia um treinador conhecido como
Ênio, que jogou no gol do Grêmio e que treinava o Força e Luz. Levou eu
e mais quatro jogadores. Começamos a disputar p Campeonato Gaúcho.
Mauricio Sabará e Dorval na escolinha do ex craque santista.
FTT: Qual
é a sua lembrança na época que jogava no Força e Luz? O futebol gaúcho
era muito bom nesta ocasião, pois enfrentava times como o Inter que
tinha Larry, Bodinho e Chinesinho, além do próprio Grêmio com o Aírton
Pavilhão que veio do Força e Luz.
DORVAL: O Aírton veio pra o Grêmio em troca da arquibancada e foi um grande jogador. Os campeonatos eram muito difíceis.
FTT: Como aconteceu a sua transferência para o Santos Futebol Clube?
DORVAL:
Vieram muitos jogadores pra cá, como o Ênio Andrade e o Raul Klein para
a Portuguesa. Tinham bons jogadores em Porto Alegre, sendo que
representamos o Brasil no Pan-Americano do México. Eu também fui
convocado, mas acabei dispensado porque era muito novo pra aquele
Pan-Americano em que se sagraram campeões. O empresário Arnaldo
Figueiredo nos levou pra São Paulo para fazer um teste. Ofereceram-me
para o Corinthians, ele havia telefonado, disse que estava tudo certo,
mas não aconteceu porque o juvenil Bataglia estava subindo. O Flamengo
também não aceitou, pois não precisava de ponta-direita. Ele ligou para o
Santos, que também não precisava, mas fui fazer um teste. Graças a Deus
fui bem e o técnico Lula pediu a minha contratação.
FTT: Isso foi mais ou menos no final de 1956. Mas parece que no inicio de 57 você teve uma rápida passagem pelo Juventus da Mooca.
DORVAL:
Fui emprestado para o Juventus e disputei o Torneio de Classificação.
Fiz um bom campeonato e outras equipes se interessaram, mas tive que
voltar pro Santos, pois era emprestado, consegui me firmar como titular e
graças a Deus dei continuidade nesta minha passagem pelo Santos.
FTT: Quando
você voltou para o Santos em 57 participou de uma grande linha de
ataque, no caso você, Jair, Pagão, Pelé e Pepe. O que você tem a dizer
sobre este ataque do Santos?
DORVAL:
Foi uma linha fantástica que fez mais de 120 gols. O Jair Rosa Pinto
estava em final de carreira, mas era um jogador que lançava muito bem. O
Pagão foi um fantástico jogador de futebol. Tive a felicidade de jogar
com estes monstros sagrados do futebol brasileiro. O Pepe numa fase
muito boa. E o próprio Pelé no início de carreira.
Dorval, Jair Rosa Pinto, Pagão, Pelé e Pepe . Um ataque arrasador em 1957.
FTT: O
seu primeiro foi o Campeonato Paulista de 1958, com um Pelé endiabrado
marcando 58 gols. Foi depois da Copa do Mundo, quando ele já tinha sido
consagrado como o Rei do Futebol. Vocês já percebiam que ele era esta
fera?
DORVAL:
Já percebíamos porque quando ele chegou, nós já íamos pra praia e
víamos. Quando o Pelé chegou, ele jogava com os reservas junto comigo e o
Pepe, pois o ponta-esquerda titular era o Tite, sendo que dávamos muito
trabalho para o time principal que tinha o time campeão de 56 com
Manga, Helvio e Ramiro. O Pagão e o Coutinho eram dois grandes
centroavantes que davam muito trabalho.
FTT: Havia na ocasião o PPP com Pagão, Pelé e Pepe.
DORVAL: Eram muito famosos. Foi muito bacana participar deste ataque.
FTT:
Em 1958 o Santos foi Campeão Paulista. Chega 59 e agora ele conquista o
Brasil, vencendo outro titulo importante, que é o Rio-São Paulo. Como
foi este torneio enfrentando os grandes times do Rio, alem dos de São
Paulo?
DORVAL:
O Torneio Rio-São Paulo era muito importante no futebol brasileiro,
sendo que hoje não existe mais. Também tinha o torneio de Seleções que
ajudava muito o jogador a ir pra Seleção Brasileira. No Rio-São Paulo
enfrentávamos grandes clubes do futebol brasileiro com timaços como o
Flamengo, Botafogo e Fluminense, todos com grandes jogadores. Quando o
Santos jogava estes clássicos, enchia o Maracanã, pois todos queriam ver
Mané Garrincha, Pelé, Coutinho, Mengálvio, Pepe, Zito, Quarentinha,
Amarildo e Zagallo. Foi um torneio muito bacana.
Santos 1959 - Lalá. Getulio. Ramiro. Pavão. Zito e Mourão Agachados: Dorval. Afonsinho. Jair da Rosa Pinto. Pelé e Pepe
FTT: Em
59 também foi o ano que você foi pela primeira vez convocado pra
Seleção Brasileira para o Sul-Americano. Você ficou emocionado por ter
sido chamado pelo Vicente Feola, sabendo que fez um bom trabalho?
DORVAL:
Fiz um bom campeonato em 58. Fui eu, Mané Garrincha e Joel, os
ponteiros que estavam em alta. Infelizmente eu não fui pra Copa do
Mundo, não sei bem o porquê, pois os jornais diziam que eu era o melhor
ponta-direita do Brasil depois do Mané Garrincha, sendo que não fui pra
Suécia e nem pro Chile. Mas foi uma alegria muito grande ter participado
de uma Seleção Brasileira que tinha grandes jogadores. Ser reserva de
Garrincha é uma honra, que pra mim foi o maior fenômeno brasileiro
depois de Pelé, jogador fantástico que deixou muitas saudades, aquele
futebol-arte que se jogava antigamente.
FTT: Os
anos 60 começavam e é justamente ai que começa a grande fase da
história do Santos, com aquele ataque que todos conhecem e citam como o
maior ataque da história do futebol, com Dorval, Mengálvio, Coutinho,
Pelé e Pepe. Como este ataque se entrosava tão bem, era uma coisa que
acontecia ou vocês ensaiavam para desse tão certo?
DORVAL:
Foi muito importante ter jogado com Mengálvio, Coutinho, Pelé e Pepe,
além do Zito e do Mauro. Foi um entrosamento muito rápido, porque joguei
no Santos durante muito tempo, nos entendíamos, parecia que
conversávamos um com o outro dentro do campo, era muito importante a
amizade que tínhamos dentro e fora, ajudando a ser o ataque que foi.
Jogávamos muito na Europa, fizemos grandes jogos lá contra grandes times
do futebol europeu e ficávamos as vezes quatro meses fora do Brasil.
FTT: A
década de 60 começa e vem uma grande sequência de títulos, talvez nunca
conseguida por nenhum outro time. Vocês foram Penta-Campeões da Taça
Brasil em 61, 62, 63, 64 (que você estava no Racing) e 65. Era o
Campeonato Brasileiro da época. Como vocês conseguiram ficar vencendo
este título seguidamente, sendo que na época tinha o Botafogo de
Garrincha, Didi, Quarentinha, além do próprio Palmeiras que também tinha
um esquadrão formidável?
DORVAL:
Nós tivemos uma fase fantástica porque, como já falei, era uma união
onde tínhamos amizade e respeito um pelo outro, criando aquele ambiente
gostoso dentro do campo e nos entendíamos conversando fora, o que foi
muito importante pra nós e para o Santos Futebol Clube. Conseguimos este
monte de títulos porque sempre jogávamos juntos e um conhecia o outro.
Hoje em dia se joga cinco partidas juntos. Nós sempre jogávamos juntos e
esta sequência era muito boa para o Santos.
Dorval, Mengálvio, Coutinho, Pelé e Pepe, quase uma rima poética
FTT: Você, como ponta-direita, enfrentou grandes laterais-esquerdos. Houve algum ou alguns que te deram mais trabalho?
FTT: Fale
dos confrontos do Santos contra o Corinthians, que eram muito
equilibrados, com o Corinthians ficando praticamente durante mais de dez
anos sem vencer o Santos em partidas válidas pelo Campeonato Paulista.
DORVAL:
O Corinthians tinha um bom time, com grandes jogadores, mas
infelizmente quando jogavam contra o Santos, não sei o que havia com
eles, eles tremiam. O time do Santos era fantástico, pois não só o
Corinthians tremia como outros.
FTT: Vamos
falar agora das maiores conquistas do Santos, o Bi da Libertadores e do
Mundial em 62/63. Quais são as suas lembranças destas duas fantásticas
conquistas?
DORVAL:
É uma lembrança muito boa porque foi o primeiro time brasileiro a ser
campeão da Libertadores e do Mundial Interclubes. Foi um torneio bom,
com grandes times. Hoje em dia não vemos mais os times que
enfrentávamos, como Nacional e Peñarol, forças máximas do futebol
uruguaio. Na Argentina tinha o Boca Juniors, River Plate, Independiente e
Racing, grandes potências do futebol argentino. Havia o Colo Colo e o
Universidad do Chile, que hoje não estão mais na Libertadores, sendo que
o futebol deste torneio caiu bastante. Times que representavam o seu
país não representam mais atualmente, pois não são mais a potência que
eram antigamente.
FTT: Mas a grande partida do Santos que todos comentam foi a final de 62, com os famosos 5 a 2 contra o Benfica.
DORVAL:
Este jogo foi fantástico. Aqui nós ganhamos de 3 a 2 e perdendo um
monte de gols, com eles jogando bem. Chegamos em Portugal e eles já
estavam vendendo ingresso para o próximo jogo, pois achavam que iam
ganhar. Deram azar por mexerem com a gente. Quando eles abriram os
olhos, já estava 5 a 0 pra nós. O Pelé neste jogo parece que estava com o
diabo no corpo. O time jogou certinho, bem armado, pois o Santos já
estava acostumado a jogar contra os grandes times europeus, o estádio
estava lotado, todos aplaudindo a nossa equipe sem saírem após a
partida. Foi algo fantástico.
Dorval é o sexto maior artilheiro na historia do Santos FC com 198 gols.
FTT: Em 67 você foi jogar o Campeonato Paulista pelo Palmeiras.
DORVAL:
O Palmeiras tinha um monte de jogadores que já estavam em final de
carreira, como o Servílio e o Tupãzinho. O Ademir da Guia e o César
estavam começando, que foram grandes jogadores e amigos, tenho até hoje
amizade com eles. O time do Palmeiras estava um pouco decadente e quando
cheguei ele não estava numa fase boa. Infelizmente não deu certo, mas
tentamos.
FTT: Depois do Palmeiras você foi para o Atlético do Paraná, sendo Campeão Paranaense em 70.
DORVAL:
Isso. Joguei com o Zé Roberto e Nílson Dias. Teve uma turma de São
Paulo que foi jogar lá, como o Djalma Santos. Foi também um grande clube
que joguei por quatro anos. Teve também o Sicupira que jogou depois no
Corinthians, grande jogador que atualmente é repórter.
Atletico
PR 1970 - Hidaldo, Zico, Julio, Hermes, Alfredo e Vanderlei. Agachados:
Dorval, Sicupira, Sergio Lopes, , Toninho e Nilson.
FTT: Depois do Atlético uma rápida passagem pela Venezuela e no SAAD.
DORVAL:
O SAAD que é atualmente o São Caetano. Foi uma época gostosa. É um time
que estava começando a despontar no futebol brasileiro. Jogaram lá o
Joel, Coutinho e eu. Foi uma passagem curta, mas bem gostosa, com uma
amizade muito grande com o pessoal de lá.
FTT: Terminada
a carreira, o Santos ainda teve alguns títulos. O que você achou desta
geração com o Robinho e Diego e atualmente o Neymar e o Ganso?
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